sexta-feira, 26 de junho de 2009

Comportamentos acadêmicos


Acadêmico não é aquele que é membro de uma academia?
É, agora eu sou. E não há nada mais engraçado que uma academia.
Saio do trabalho e vou ali me mexer, fazer incansáveis exercícios físicos, ‘puxar ferro’ como dizem. E como é divertido!

Para começar que tudo de mais bonito se encontra lá: jovens espinhentos suados e de regata, ou abadá da micareta passada, senhoras querendo perder a ‘pochete’, tiozões querendo manter a forma atlética dos tempos em que fazia parte do quartel, ou pra manter a saúde e não enfartar novamente, gordinhas querendo emagrecer (eu) e em alguns casos, magrelas ganhando músculos, peso e um voluminho na roupa. HEHE.

Mas os especiais são aqueles com músculos superdesenvolvidos, os famosos ‘bombados’. Aí é uma lindeza só, né? Acho que eles nunca ouviram de nenhuma tia na infância ‘nossa, como você cresceu’ e quiseram descontar tudo agora. Toma, tia!!

Bem, como já disse, estava na academia pra perder uns quilinhos e, ao iniciar a aula de jump, onde se pula (a vá!) sem parar numa caminha elástica, já percebi que meu sedentarismo, a barra de chocolate que havia comido e os maus hábitos juvenis começaram a pesar. Eu suava, não respirava direito, me descoordenava toda e morria de inveja da professora, que com mais de 40 anos me ‘dava um coro’.

O que me consolou (um pouco) naquela aula, foi olhar ao redor. Um senhor simpático (demais até, rs), barrigudinho e bem disposto, pulando tanto quando a professora e várias outras pessoas quase no mesmo estado que eu. É, quase porque elas já faziam a aula há mais tempo. Acho que eu estava em desvantagem..

Eu pulava e lembrava quão boa é minha cadeira em frente ao computador, quantas coisas eu tinha que pesquisar, no esquete de teatro que teria de apresentar, e outras tantas coisas, menos estar ali.

Terminada a aula, eu me sentindo mais leve, disposta, magra e etc (tudo aquilo que eu não era e que vai demorar pra me acontecer, mas a adrenalina liberada já me enganou), quando vou para o vestiário me trocar e vejo uma daquelas belezas masculinas já citadas, de regata e com peitos maiores que os meus (fato) lendo! Acreditem se quiserem!

Mas não deu nem tempo de pensar “Menos mal, pelo menos ele l..” e vieram mais outros ‘bombados’ amiguinhos daquele, dizendo (enquanto se esmurravam): OLHA ELE, QUE BIXISSE, TÁ LENDO! PARE OW!! HAHAHAHA (altas gargalhadas)

Nem fiquei em shock porque já era de se esperar, vindo de alguém que tem a cabeça quase menor que os músculos do trapézio, mas foi demais. Segurei o riso de desgosto até o vestiário e segui em frente.





É a vida, minha gente. Os comportamentos acadêmicos estão cada vez piores! E eu, pequena gordinha, que me acostume com isso. Não dizem que toda beleza tem seu preço? Esse é o que eu pago!



sábado, 20 de junho de 2009

Lição de casa


- Três contos do livro Cadeiras Proibidas - Ignácio de Loyola Brandão - se reúnem nesse texto, num novo contexto, mas com as mesmas características. São eles: "A menina que não queria atravessar a rua", "O homem do furo na mão" e "O homem cuja orelha crescia".




Vila Maria é uma pequena cidadezinha do sul do Brasil onde paira um cenário europeu da década de 60. Os senhores andando bem alinhados e as senhoras sempre com o 'rouge' as representando. Crianças brincam alegremente pelos parques com folhas de outono espalhadas pelo chão, e adultos levam uma vida corriqueira de trabalho, mas sem a correria dos dias atuais.

Nesta vila resido eu, Clarice, que como toda mulher adulta, realizo meu trabalho e estudos com muita habilidade e sou sempre bem vista por minhas roupas elegantes. Hélcio é um adolescente que sofre mutações, como todos, mas uma em especial. Quando pequeno, sua mãe o avisara do distúrbio que possuía na orelha, porém nada tinha se manifestado até seus 17 anos. Ao completar tal idade, o que parecia profecia, se cumpriu: metros de carne cresciam da orelha de Hélcio, que só não se desesperava mais, porque tinha encontrado um gorro que suportava o tanto de carne que crescia a cada dia.

Tiago andava pelas ruas com certo receio, e as pessoas com o mesmo sentimento por ele. Olhavam, não enchergavam, mas sabiam que algo de errado acontecia com ele. Por usar luvas de vez em quando, o furo na mão de Tiago não aparecia muito, mas sua cara de estranheza espantava a todos. Apesar de gostar de seu 'defeito', sabia que para os outros, aquilo era perfeitamente inconcebível, então se resguardava.

No feriado de Páscoa, eu e esses dois seres até então estranhos, estávamos tomando nossos cafés da manhã, cada um em uma mesa, solitários. Eu não ligo, sempre fui assim. Saindo da padaria, os três solitários pararam no semáforo, que logo abriu. Um atravessou e outro insistiu em me ajudar. Não queria! Gostava daquele lugar e ali queria ficar, oras!

- Vamos, eu ajudo a senhora.

- Onde tem uma senhora aqui, rapaz?

- Desculpe-me, TE ajudo a atravessar. Apesar de estranho, não ofereço perigo.

- Não confio em pessoas com carne de orelha nos gorros.

- Mas na cidade só eu sou assim.- Pois então, não confio e nem quero sair daqui.

- Por que será que ninguém nunca quer ao menos conversar comigo?

- Acho que é por que você é estranho.-

Mas eu não sou! A única parte estranha é minha orelha!

- Isso já basta para fazer de você uma pessoa estranha. Aposto que não tem hábitos muito bons. Mas chega, atravesse a rua que eu fico aqui. Até logo.

- Não tenho não! Eu como, durmo, estudo e tento trabalhar como todo mundo que aqui está. E não vou atravessar a rua até que a senhora vá.

- Senhora, não! E pode esquecendo que daqui eu não saio.

Ao ver a discussão do outro lado da rua, Tiago que estava sem as luvas me chamou com aquela mão furada para atravessar, resolveu aderir ao movimento do orelhudo.

- Pois não vou! Podem me deixar em paz?
- Por que quer ficar aqui? – dizia Hélcio
- Por que quer me tirar daqui?
- Moça..
- Clarice!
- Clarice, pare com esse comportamento infantil!
- Não é infantil, olha bem pra minha cara de quem é criança!

Agora no mesmo lado da nossa calçada, Tiago interferiu:

- Ela está certa, não é criança. É adolescente.

E antes que eu falasse o primeiro nome feio que veio à minha cabeça, o mocinho da mão furada completou:

- Os adultos só são a capa. Somos e sempre seremos eternos adolescentes, nos transformando e procurando coisas novas, aprendendo e nos surpreendendo cada dia mais com as pequenas coisas que acontecem. E claro, tendo as mesmas atitudes dos que tem espinhas na cara: birra, marra, medos, proteções ásperas, temperamento difícil. Portanto, não vejo estranheza na atitude desta menina, que mais parece uma mulher de quarenta e poucos. Vamos, Hélcio, quando ela quiser, atravessa.

- Como sabe meu nome? – indaga Hélcio

- Vi na comanda da padaria.